“NÃO TÁ GOSTOSO!”
Quem está ligado nas redes sociais deparou esta semana com o vídeo da “Minha Professora Gringa” no YouTube reclamando das nossas concordâncias com adjetivos. Nós fazemos mesmo isso, mas, realmente, seria necessário?
Do que a gringa reclamou?
A professora faz um vídeo muito bem-humorado reclamando das nossas obrigatoriedades sintáticas de concordância com adjetivo. É uma das marcas dos substantivos concordarem em número e gênero com adjetivos e artigos, por exemplo. Número refere-se a singular e plural, enquanto gênero tem a ver com masculino e feminino.
O estranhamento dela se deve ao fato de que não há essa necessidade no inglês. Então, ela dá como exemplo: “I am beautiful. You are beautiful. We are beautiful”. Já em português: “Eu sou bonita – mulher. Você é bonita – não! Bonito. Homem. Nós somos bonitos – ou bonitas. Se forem mulheres”. E conclui, zangada: “Não tá gostoso!”.
As línguas não se comportam uniformemente
É muito comum que tentemos falar outra língua com a organização sintática da nossa. Isso é uma prova de que não é suficiente saber somente o significado das palavras em outra língua. Você precisa ter uma boa convivência para chegar ao perfeito uso das relações sintáticas: as concordâncias, as colocações de preposições, as conjugações verbais, etc.
Mas note que algumas particularidades de outras gramáticas parecem ser mais fáceis do que outras. Quando ela aponta a confusão grande que faz a partir da obrigação de concordar o adjetivo com o substantivo, fica evidente que isso se dá porque na sua língua, o inglês, o adjetivo não exige essa ação. É como se disséssemos “casas amarelo”, “carros amarelo, “bota amarelo”.
As dificuldades podem ser maiores
Ela continua lembrando ocorrências de exceções e variações (que ocorrem em todas as línguas), como o caso de “bonitona” e “bonitão” (e não “bonitono”, como ela fala e causa risos a muita gente). Eu mesmo já passei por uma situação parecida, em que um americano falou genro e “genra”. Seria lógico.
Para nós, parece que a conversa se encerra nesse prazer de compreender o complexo. Mas as línguas avançam. Sua tendência é preferir o mais simples. Portanto, se num futuro a médio ou longo prazo for possível o “casas bonito”, não me espantarei. Aliás, uma tendência parecida ocorre com a conjugação de verbos. Outro dia vamos falar disso.
Para sentirmos a agonia da “Minha Professora Gringa”, imagine que há línguas indígenas com mais de 12 classificadores nominais, como se fossem gêneros. Nós temos masculino e feminino. O alemão, além desses, tem também o neutro. Quando você pensa em 12, consegue imaginar o tanto de possibilidade que isso implica? Certamente também não ficaria gostoso pra nós.

Pelo link abaixo, você consegue baixar, gratuitamente, a página em PDF do Jornal de Brasília:
https://cdn-acervo.sflip.com.br/temp_site/issue-6018-9601aef5d3063fe88d64e84faa40b138.pdf